26/09/2023

 

O Setor dos Media na Europa - que desafios para Portugal no quadro do European Media Freedom Act” (EMFA), foi o tema de mais um debate promovido pelo eurodeputado João Albuquerque em torno do regulamento europeu sobre a liberdade dos meios de comunicação de comunicação social e a proteção dos jornalistas, que contou com a participação da presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), Licínia Girão.

Na sessão, que teve lugar na Universidade de Aveiro na passada sexta-feira, Licínia Girão reforçou a posição da CCPJ, já defendida em Bruxelas em março último, nomeadamente de que só é possível defender o Jornalismo e os jornalistas se existir entendimento entre os diversos parceiros da atividade jornalística, de que só pelo exercício de um escrutínio isento, rigoroso e independente dos diferentes setores da sociedade, é possível garantir a continuidade e afirmação da Democracia.

Os cidadãos exigem informação ao minuto, ao mesmo tempo que dos jornalistas esperam que cumpram o superior compromisso ético com a verdade. E este desígnio, no entendimento da CCPJ, só é alcançável quando nos escutarmos uns ou outros. Jornalistas, operadores (nacionais, regionais, locais ou internacionais), académicos, legisladores e consumidores da informação.

Licínia Girão defendeu ainda que “o Jornalismo é hoje um lugar estranho. Onde os jornalistas têm cada vez mais dificuldade em permanecer e alguns mesmo, como se tem vindo a demonstrar através de testemunhos, notícias e relatórios, em aceder. Aceder ou alcançar não um lugar, mas sim o espaço, a posição inviolável de um tempo e um momento de liberdade. De liberdade de expressão, de criação, mas sobretudo, de compromisso com a verdade. Dos poucos, senão únicos, que se têm revelado pilar e barómetro da Democracia”.

Salientou ainda a presidente da CCPJ que “o Jornalismo é simplesmente jornalismo. E os géneros jornalísticos há muito que estão definidos. Confundir a construção de uma notícia, produção de uma reportagem, a elaboração de uma entrevista ou perfil, uma crónica, a prática de retratar e relatar acontecimentos através de imagens ou sons, com a produção de conteúdos da mais diversa natureza, é mais do que uma perversão, é uma profanação da essência e do fim último desta atividade”.

A realidade atual tem demonstrado que são cada vez mais os jornalistas e operadores que têm vindo a ceder a interesses e a facilitismos. E quem tira proveito desta desordem, do desvio do propósito e fim do Jornalismo, são, obviamente, líderes partidários, governantes, o poder económico, financeiro, desportivo, entre outros. 

A CCPJ defende que a liberdade dos meios de comunicação social de natureza jornalística e a defesa dos jornalistas tornou-se numa necessidade imperativa a nível nacional e europeu. Sem pluralismo na informação, sem interferência dos Estados na gestão e operacionalidade dos órgãos de comunicação social públicos (e até em alguns casos já privados), sem transparência no financiamento de todos os operadores (e a todos os níveis, incluindo subsídios europeus, estatais e publicidade), sem garantias de que os jornalistas, em circunstância alguma, podem ser vigiados, não se pode falar em independência, imparcialidade, rigor e isenção.

O facto, por exemplo, da exceção à implementação de sistemas de vigilância dos jornalistas e das suas famílias, prever motivos de segurança nacional (sem critérios definidos e transparentes para justificar o recurso a este argumento), é a brecha que países como a Hungria, a Polónia, a Grécia ou a Itália, necessitam para agir arbitrariamente. E outros lhe seguirem o caminho.

É entendimento da CCPJ que o EMFA poderá contribuir para a salvaguarda dos cidadãos e do seu direito a serem informados, se os conteúdos informativos de natureza jornalística forem, efetivamente, produzidos por profissionais qualificados. Se o escrutínio político, económico, social, cultural, religioso, etc., for feito por que detém formação e competência reconhecida pela acreditação para o exercício da atividade jornalística.

O European Media Freedom Act só por si, e nos termos em que está redigido atualmente não será efetivamente suficiente e pode, em alguns aspetos, ser um retrocesso, como é o caso da possibilidade de vigiar os jornalistas em determinadas circunstâncias como a defesa da segurança nacional. Ou de não ser efetivamente claro que a obrigação na transparência do financiamento dos operadores seja alargada a todos, sem exceção.

No entanto, se ajustada e clarificada também no que respeita aos conceitos do que é um serviço de comunicação social, distinguindo claramente os setores informativos dos restantes, e os primeiros terem de ser e só assegurados por jornalistas, será dado o passo importante na defesa do Jornalismo e da proteção dos jornalistas. Sobretudo, se a este Regulamento se vierem juntar outros normativos europeus como é o caso da diretiva que a Comissão Europeia apresentou relativa a ações judiciais estratégicas contra a participação pública, geralmente conhecidas por "SLAPP" - processos judiciais infundados ou abusivos, que são cada vez mais uma realidade e condicionadores da Liberdade de Imprensa.

Assim como, também é chegado o momento de o legislador nacional olhar para os há muito desajustados normativos legais que regulam a atividade dos meios de comunicação social e dos jornalistas. É imperativo, por exemplo, definir claramente o que é um órgão jornalístico, o que é um ato jornalístico, e uniformizar a acreditação dos jornalistas.

Por fim, ficou ainda clara a posição da CCPJ sobre a possível criação de um Comité Europeu dos Serviços de Comunicação Social, defendendo que este deverá todos os reguladores da atividade jornalística, incluindo os reguladores dos jornalistas.