A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) tem-se confrontado com um notório aumento de pessoas que se identificam, e permitem que as identifiquem, como jornalistas sem que sejam portadoras da Carteira Profissional de Jornalista ou do Título Provisório de Estagiário.
A situação confunde, acima de tudo, o público consumidor de informação de natureza jornalística, uma vez que julgarão estar a aceder a conteúdos produzidos por quem se outorga o estatuto de jornalista confiando que se trata de um profissional habilitado.
Quem se assume como jornalista, sem para tal estar habilitado engana os cidadãos, atua à margem de uma profissão constitucionalmente protegida e regulada e prejudica toda a classe profissional dos jornalistas legítimos. Os conteúdos produzidos por pessoas que não são jornalistas não estão abrangidos pelas obrigações legais impostas a estes profissionais pelo Estatuto do Jornalista (EJ), entre elas o dever de informar com rigor e isenção, orientados pelos princípios da transparência, credibilidade e convicção da verdade; o dever do sigilo profissional e o direito à cláusula de consciência, entre outros direitos. Também por isso, não estão vinculados aos deveres de natureza ética e/ou deontológica da profissão consagrados no Código Deontológico e também não estão sujeitos ao regime de incompatibilidades (previsto no artigo 3.º do EJ) e à tutela disciplinar da CCPJ (por violação do artigo 14.º, n.º 2, do EJ).
Estes comunicadores podem criar no público a perceção errónea de que qualquer indivíduo pode identificar-se como jornalista e/ou repórter e praticar atos próprios dos jornalistas, apenas porque se autodenomina “jornalista” ou “repórter”.
Esta prática, cada vez mais generalizada no campo dos media, é danosa para profissionais do jornalismo que sabem o quanto custa produzir uma informação credível, rigorosa e isenta, desenvolvida com esforço e no cumprimento dos princípios éticos e dos deveres que regem a atividade, entre outros normativos legais.
Refira-se ainda que a CCPJ tem também notado que muitos dos detentores de outros títulos de acreditação, nomeadamente de Cartão de Equiparado a Jornalista (TE) e Cartão de Identificação de Colaborador (CO), se identificam como jornalistas sem que nunca tenham acedido à profissão.
A profissão de jornalista inicia-se, obrigatoriamente, com a frequência de um estágio profissional. Neste período o estagiário já pode exercer a atividade na condição integral de jornalista munido de um Título Provisório de Estagiário (TPE) por exigência no determinado pelos artigos 5.º do Estatuto do Jornalista e 6.º do Regime de Organização e Funcionamento da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista e da Acreditação Profissional do Jornalista (Decreto-Lei n.º 70/2008 de 15 de abril) e, ainda, da Regulamentação de Estágio de Acesso à Profissão de Jornalista (Portaria n.º 318/99 de 12 maio). No fim do estágio com aproveitamento tem-se então direito à Carteira Profissional de Jornalista. Ambos os títulos são obrigatórios para quem faz do jornalismo a sua ocupação principal permanente e remunerada como resulta dos artigos 1.º e 4.º do Estatuto do Jornalista.
A CCPJ tem vindo a desenvolver uma prática pedagógica no sentido de advertir e solicitar a quem se identifica como jornalista que deixe de o fazer. Contudo, obrigado que está ao cumprimento da lei, este organismo independente de direito público, tendo em conta o agravar da situação, continuará a desencadear os procedimentos legais necessários para a abertura de processos de contraordenação às pessoas que se identificam como jornalistas, não o sendo e aos órgãos de comunicação social de natureza jornalística ou com um demarcado e autónomo setor de informação, que permitem que não portadores de acreditação profissional nele exerçam funções praticando atos próprios da profissão de jornalista.
Mas passará também a denunciar a situação à Procuradoria-Geral da República, uma vez que em causa poderá estar a prática de crime de usurpação de funções. Crime de natureza pública previsto no artigo 358.º do Código Penal.
Plenário da CCPJ
Lisboa, fevereiro de 2024